domingo, 7 de abril de 2013

O embalsamamento não é uma técnica nova e sim pouco divulgada



Artesãos da Morte: técnicos de necrópsia explicam quem são, o que fazem e a importância da conservação do cadáver para a utilização da maquiagem.

O embalsamamento não é uma técnica nova e sim pouco divulgada. Se nos cuidamos em vida, porque
não divulgar o trabalho destes profissionais fantásticos que cuidam de nós após a morte?
A preocupação maior é amenizar a dor do choque, principalmente da família.Quem tem medo da morte?
Com certeza eles não tem. Lidam com ela vinte e quatro horas por dia e garantem que nada
relacionado à isso os assusta. Trabalhar com o corpo humano é considerado por alguns um privilégio,
já que são poucos que tem a coragem de explorar esta maravilhosa máquina. Eles são os profissionais
que realizam um trabalho fantástico, ao contrário dos médicos, que cuidam do corpo vivo, se
responsabilizam por tratar e cuidar de um ser humano morto. São os embalsamadores de cadáveres,
profissionais que têm a tarefa de preparar o corpo do falecido e fazer com que ele fique o mais
"apresentável " possível na hora do velório. A idéia é, em partes, amenizar a dor da família, esta que,
- mal falando - após a devida conservação do corpo, têm a impressão de que o falecido está apenas
dormindo, tamanha a perfeição do trabalho dos embalsamadores, que juntamente com os maquiadores,
realizam um trabalho acima de tudo artesanal.
O trabalho dos maquiadores não teria sentido sem o do embalsamador. Não existe a possibilidade de

falar de um sem citar o outro. Um conserva o corpo, o outro dá os retoques finais de preparação para o
velório. De acordo com o necropsiador Geraldo Ferreira, de 63 anos, para haver a maquiagem de um
cadáver é extremamente importante que antes haja o embalsamamento. Isso porque ao maquiar um
corpo não conservado, higienizado e preparado podem ocorrer acidentes, como por exemplo, vazar
algum tipo de fluído " principalmente sangue - por um dos orifícios naturais do corpo " nariz, boca,
ouvidos. " O corpo embalsamado, uma vez feita a maquiagem pode durar muito mais tempo, até dias
em relação ao não preparado. Uma maquiagem desmanchada por um vazamento pela narina, por
exemplo, é muito mais agravante para a família do que uma maquiagem bem feita em um corpo
anteriormente preparado corretamente", explica Cirino Santos, necropsiador e diretor técnico da
empresa Labtemforj (Laboratório Técnico de Embalsamamento e Formolização no Rio de Janeiro)
localizado no bairro de Inhaúma.
Os profissionais são contratados quando trabalham em laboratório. Mas também existem os free

lancers " profissionais temporários " mas não são divulgados porque muitas vezes trata-se de
trabalhadores clandestinos que não são reconhecidos pelo meio funerário. Um profissional que trabalha
com embalsamamento e maquiagem ganha em média entre 2.200 e 3.000 reais por mês e o custo do
serviço para os familiares chega a variar de 360 a 1500 reais. "Não tenho como dizer quanto ganha um
profissional que trabalhe só com maquiagem porque isso é raro. Geralmente o maquiador é também embalsamador porque um trabalho depende do outro", completa Geraldo.
Um técnico de necrópsia trabalha devidamente protegido. Luvas, avental, óculos de visão panorâmica que

facilita a visão por todos os ângulos, entre outros fazem parte dos instrumentos que protegem o
profissional. Já em ação, a pinça dente de rato, o escorpo, a costótola, o enterótomo, o barbante, sondas
e até bico de regador são usados na construção de um embalsamamento. Já o maquiador utiliza
materiais comuns de maquiagem, principalmente um reativador - espécie de base -, batom , rímel e lápis
no caso das mulheres e nos homens apenas um reativante nos lábios, sobrancelhas e rosto. O material é
metade nacional - bases, batom, rímel " e metade importado " cera necrofílica, a solução à base de
formol, os reativantes. O custo do material é variado, dependendo do tipo de morte. Há casos em que é necessário a utilização da cera necrofílica " perfuração por bala, por exemplo -, outros não.
O processo todo de conservação de um cadáver é lento e o tempo em que ficará retido no laboratório

depende de diversos fatores, entre eles o tipo de morte. Ao chegar, retira-se a roupa do cadáver
" existe uma pessoa que ajuda a fazer este trabalho-, porque ele geralmente está exalando algum odor desagradável. Depois é colocado em uma mesa, higienizado com cloro, dá-se um banho medicinal e a
partir daí que começa o trabalho do embalsamador. Ele começa a incisão por um vaso calibroso, o
femural, por exemplo, introduz uma sonda e logo depois um canalizador que vai viajar por todo corpo.
Se não houver a possibilidade de se começar pela femural, outros vasos como a carótida, aorta ou umeral
podem ser utilizados mas para isso tem-se que abrir o cadáver. E se mesmo assim não der, o processo
de embalsamamento terá que ser feito ponto-a-ponto com uma agulha. Então esse cadáver não demorará
mais quatro horas para sair do laboratório, mas seis, oito ou até um dia. "Há casos em que não dá para
fazer por vasos calibrosos e temos que fazer o embalsamamento ponto-a-ponto (a cada meio centímetro
do corpo faz-se um furo com uma agulha) e isso demora. . Portanto sempre digo que só a partir de duas
horas aqui no laboratório que eu posso dizer para a funerária ou para os familiares quanto tempo o
cadáver ficará retido aqui", explica Geraldo Ferreira.
O embalsamamento protege não só o corpo mas como a família dentro da capela. Isto porque uma

pessoa pode morrer de uma doença infecto contagiosa " tuberculose ou aids, por exemplo - e uma vez
preparado, conservado e devidamente limpo, este corpo não apresentará mais riscos de transmissão de
doenças. O trabalho do embalsamador é proteger o corpo e a família, de todo e qualquer problema.
E o cuidado dos profissionais não é só com o cadáver. Eles tem que adotar diversas medidas de
segurança porque nunca sabem com quem estão lidando. "Todo cadáver que chega aqui é
cuidadosamente manuseado. Porque nós temos primeiro que nos proteger, visando a proteção da
família e principalmente de todas pessoas que tocarem o corpo, seja o maquiador, o embalsamador
ou até o motorista da ambulância", conta o diretor do laboratório de embalsamamento Labtemforj,
Cirino Santos.
Ser embalsamador não é tarefa fácil. Em alguns casos, como explica o necropsiador Geraldo, o corpo
chega no laboratório totalmente desfigurado, tornando o trabalho de reconstituição muito difícil. Em
casos de atropelamento ou incêndio, ele conta que por muitas vezes a família manda uma foto do
falecido para que haja a reconstrução. Geraldo chega a ficar até seis horas, ou às vezes quase um dia
na preparação de um corpo deste caso. " Uma pessoa que levou um tiro, que ficou com um furo no
rosto,
por exemplo, temos a obrigação de colocar tudo no lugar, os ossos, a pele, ou seja, reconstituir.
Tudo tem que ser muito bem suturado para o maquiador poder trabalhar e esconder totalmente o
ferimento para não causar mais um impacto à família", diz.
Em casos de tiro ou qualquer outra perfuração no corpo que a roupa não possa esconder, Cirino

esclarece que é usado uma cera necrofílica, que é colocada após a sutura do técnico embalsamador.
Isso faz com que o buraco suma, facilitando o trabalho final do maquiador. O trabalho perfeito consiste
em fazer com que o cadáver, que por muitas vezes, chega ao laboratório assustador para o técnico
quem dirá para a família, saia de lá com um aspecto "vivo", causando assim menos impacto nos
familiares que já têm que suportar a dor da perda. O trabalho do embalsamador é acima de tudo,
social.
O ofício de preparação de cadáveres para velório é bonito e é uma profissão regulamentada. Como foi
citado antes, o profissional habilitado a apenas maquiar cadáveres é raro. Existe o embalsamador que
é responsável por todos os estágios de conservação do corpo. Apesar de existirem cursos técnicos
para maquiadores " em São Paulo, Belo horizonte e Bahia - a profissão isolada ainda não é
reconhecida. "Fiz o curso de embalsamador na Unesp em São Paulo e não tenho conhecimento nem
de curso para maquiadores nem embalsamadores no estado do Rio de Janeiro", diz o técnico Cirino.
"A prática me ensinou", complementa o também Policial Civil, Geraldo Ferreira.
Michele Cristina Fardilha, de 31 anos, trabalha há quase um mês com os dois técnicos de

embalsamamento " Geraldo e Cirino " no laboratório Labtemforj, em Inhaúma. Ela diz ser ajudante dos
profissionais e, apesar de trabalhar com maquiagem de cadáveres, afirma que ainda não tem curso
técnico para tal. O trabalho de Michele é auxiliar os técnicos com os materiais, colocar o corpo na
mesa para iniciar a preparação, costurar, enfim, a jovem está aos poucos se profissionalizando na área
de embalsamagem. "Tenho medo de morrer mas não tenho de lidar com isso. Parece contraditório.
Mas acho que o medo de morrer vem principalmente quando eu vejo crianças", diz.
Medo é algo que os técnicos que trabalham com cadáveres realmente não têm. Por outro lado existe

um fator que os incomoda: o preconceito. " Existe um preconceito muito grande. Já tiveram pessoas
que não apertaram a minha mão justamente por eu trabalhar com esse tipo de atividade. Ninguém se
preocupa em saber se trabalhamos protegidos ou não", ressalta Cirino. "Tem uma amiga minha que
disse que não ia comer mais a minha comida", acrescenta Michele.
Sobre esta questão, Geraldo Ferreira, que já trabalhou no Instituto Médico Legal e está há quarenta

anos no ramo diz que o preconceito existe até no meio funerário. "O cara chega aqui e não ultrapassa
a porta. Ele fica dali para fora e é porque já tem um certo preconceito. Esse preconceito não é só com
a gente, é com o coveiro, o lixeiro". Ele acrescenta que no círculo de amizades procura não lembrar do
que faz, porque com certeza se o fizer, comentários surgirão, até pela idéia que a sociedade faz de
morte. Quando se fala em cadáver, a reação que a maioria das pessoas têm é de nojo.
Preconceito incomoda quem trabalha em funerárias ou laboratórios de embalsamamento. Apesar disso,

é difícil de acreditar que não existe nenhum tipo de nojo ou medo por parte dos profissionais.
Geraldo Ferreira conta que antes de trabalhar com isso, ao ver um cadáver tinha dor de cabeça e
diarréia mas com o tempo se acostumou. Ele é estudioso da obra de Alan Kardec e afirma discordar
em uma passagem do autor, quando ele diz que toda pessoa que trabalha com o corpo humano é
naturalmente um materialista. Cirino afirma com absoluta certeza que não tem medo de morrer e que
não acredita em morte. Ele diz acreditar no espírito. Para ele o espírito não morre, aliás, ele ressalta
que nem a matéria morre, se transforma. " Creio muito mais em Deus agora. Quando vejo a máquina
que ele fez. O corpo humano pra mim é divino e eu tenho orgulho de pode viajar por ele. Um amigo meu
já dizia que todo ser humano deveria passar pelo menos duas horas dentro do IML para saber um
pouco do próprio corpo", finaliza Geraldo Ferreira, o mais antigo necropsiador do Rio de Janeiro, que já
preparou o corpo de famosos como por exemplo, do ex presidente Juscelino Kubitscheck.

Autor: Nathália Rodrigues e Thayana Araujo

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